Sobre DRM - em 2005
Amanhã apresento uma palestra sobre DRM -
Olhando por aqui, me deparei com esse texto que escrevi em 2005 -
estava predizendo corretamente os rumos que estamos tomando - não precisei alterar quase nada nele (não menciona por exemplo, BluRay) -- estou publicando ele aqui - creio que na época ele foi enviado apenas por e-mail.
Texto em resposta à:
http://www.homemediaretailing.com/news/html/breaking_article.cfm?article_id=7953
On Friday 02 September 2005 22:38, Jean Habib wrote:
> alguem pode me explicar melhor essa historia de "secure video
> files" e locked down hardware??
> me pareceu sinistro
>
Não é só parecer sinistro. _É_ sinistro.
Vou tentar explicar bem - só peço uma coisa: divuilgue minha explicação, se achar legal.
(Vou dar uma idéia do que já acontece antes, e apontar para o que o cara está falando mais na parte II)
Bom - tudo isso leva o nome geral de DRM - sigla em inglês para "Digital Rights Management" - "Gerenciamento Digital de Direitos". O problema é que esses "direitos", assim como o 'trusted" (confiável) que aparece nos nomes dessas tecnologias, não tem nada a ver com direitos de quem vai assistir os vídeos, ou mesmo de quem queira produzir vídeos ou músicas. São aos direitos e confiança das mega-corporações que essas palavras se referem. A perpetuação da cultura de produção centralizada "uma pessoa faz para muitas" - com a ideologia da revolução industrial de três séculos atrás.
Mas como isso acontece?
Bom - a idéia toda é evitar a assim chamada "pirataria".
PARTE I: DRM nos dias e DVDs atuais:
Então, num primeiro estágio, o que já está presente, temos a DRM presente nos DVDs atuais. São duas tecnologias de proteçào contra cópia que já existem em todos os DVDs. Aliás, 3. Primeiro é o "macrovision". tente copiar um trecho de DVD para videocassete (vamos supor que você queira gravar uma cena de 20 segundos de um filme que augou para comentar numa aula ou palestra - algo perfeitamente _legal_ sob a legislaçào de qualquer país - isso seria uma citação). O macrovision é uma codificação habilitada na saída do reprodutor de DVD que _estraga_ o sinal de vídeo. Ele faz o brilho da imagem variar entre os frames de uma imagem. As TVs como tem um sistema de compensaçào lento (e as TVs atuais que são feitas para colcaborar com o macrovision), pegam a média desse brilho, e passam o filme de um jeito que fica assístivel (mas com qualidade bastante piorada). A "jogada" é que o videocassete, como é mais preciso (e os videocassetes modernos que foram feitos para colaborar com o macrovision) tentam gravar essas variações de brilho, "arrumando" o sinal de forma que quando for reproduzido, as variações sejam perceptíveis na TV. Ou seja - a gravação fica intragável. Agora a parte legal: macrovision não 'eo nome do sistema de proteção, mas da empresa que vende o sistema de proteção. O que isso significa? Significa que sua produtora de vídeo _paga_ a empresa macrovison para poder usar esse sistema que deteriora a imagem. Ou seja: você paga mais caro para assistir o filme com uma imagem pior. E não pode fazeruma cópia do mesmo, nem pra remédio, nem se for dentro da lei (então só com essa proteção, as empresas de conteúdo já passam por cima das leis existentes).
Não contentes com isso, há uma forma de proteção dos arquivos digitais em si: Eles são criptografados com chaves sigilosas, e só "fabricantes oficiais" de DVDs, ou drivers (os programas não os dispositvos físicos - "drives") de reprodução de DVD recebem do consórcio que determinou o formato de DVD as chaves que permitem a decodificação desses arquivos. O que isso significa? Que se você quiser fazer um leitor de DVD com código livre - ou mesmo simplesmetne com "fonte aberta" - isso é, código que pode ser visto por todas as pessoas, ou mesmo queria simplesmente fazer um programa independente para ler DVDs, você não pode. Não pode porque não tem o código secreto. E em muitos países, mesmo que você obtenha o códiog secreto para poder ler DVD's, é ilegal ter esse código (no Brasil inclusive). Por que ilegal? Por que essa éo outro front que o artigo original cita: além de fechar o cerco do lado tecnológico, as mega-corporaçòes fecham o cerco do lado legal: elas fizeram aprovar legislação nos Estados Unidos, e em vários países( incluindo Canada, Japão e Brasil) que torna ilegal contornar um dispositivo tecnológico de proteção contra cópia. O qu e isso significa? Que teoricamente é ilegal assistir um filme que você comprou com seu dinheiro, num drive que de DVD que você comprou com seu dinheiro usando um sistema operacional que não seja o Windows ou o Mac OS X. Nós só conseguimos assisti-los por que um hacker, conhecido por DVD Jon quebrou esse código secreto há alguns anos atrás e o difundiu pela internet. Mesmo assim, por questões legais, a maioria das distribuições GNU/Linx não pode incluir entre seus programas o código necessário para assistir DVD's.
A "terceira proteção" não é necessariamente uma proteção contra cópias, mas as nossas velhas amigas "áreas" de DVD - um simples byte que diz e que país (teoricamente) um disco de vídeo pode ser reproduzido e em que países não pode. A história oficial dessa "proteção" é permitir que as distribuidoras tenham controle sobre os "ciclos de vida" de seus filmes, evitando que um filme seja importado em DVD em um país em que ainda está sendo exibido nos cinemas. Não estou escrevendo, para ficar conciso, as implicações lógicas e morais de decisões como essas - mas a títulod e exemplo, tente imaginar que eu escrevesse um livro, mas que proibisse as pessoas que moram na Austrália de lerem esse livro - mesmo que elas tenham importado o livro do Brasil, antes de lança-lo lá - SE Ë que eu vá fazer algum lançamento na Austrália algum dia. Com DVDs acontece EXATAMENTE ISSO! - Um DVD editado na Europa não pode ser assistido (oficialmente) no Brasil, mesmo que ele nunca seja publicado no Brasil!
PARTE II, DRM do futuro:
Bom, agora que passamos a parte boazinha da coisa, vamos descer ao nosso futuro. O que acontece? Apesar de todas as precauções acima, se eu quiser eu faço uma cópia de um DVD. Os mesmos mecanismos que me permitem le-lo a partir do software livre me permitem fazer cópias do mesmo. Então, os executivos das mega-corporações investiram e estão investindo bastante dinheiro na próxima geração de equipamentos e padrões de áudio e vídeo para que isso não seja mais possível.
E bastante dinheiro significa que eles podem pagar caras tecnicamente habilidosos (não dá para usar a palavra "bom" para um cara desses) para evitar que qualquer áudio ou vídeo ou texto, ou qualquer outra mídia, seja reproduzido sem autorização explícita do detentor dos direitos autorais. (Não do autor - nesse mundo, de forma nada irônica, o autor nunca é do detentor dos "direitos autorais". Na melhor das hipóteses ele é o detentor e passou a mega-corporação que o produz os direitos de exploração da obra por 10 anos)
Bom...as tecnologias que vão tornar o vídeo "seguro" (insisto: seguro para a produtora, não para quem assiste.) estão sendo colocadas no mundo aos poucos - uma barra de cada vez.
Elas foram apresentadas pela primeira vez em conjunto ao público me geral quando a Microsoft anúnciou o esquema do que seria o próximo Windows. Isso foi em 2003, ou 2002. O conjunto de tecnologias para o "locked down hardware" (Hardware trancado) na época foi apresentado com o nome de Palladium (procure no google por palladium, ainda devem existir alguns artigos por aí). Basicamente é um esquema que envolveria todos os componentes envolvidos na reprodução de um filme (ou áudio, um texto, ou execução de um programa...vou usar filme como exemplo), de forma que somente o uso autorizado desse filme possa ser feito - por exemplo, ele só possa ser asssitido. Qualquer modificação na cadeia de componentes que pudesse permitir que o vídeo fosse guarado para ser visto posteriormente, ou redublado, ou copiado, estragaria uma das peças do sistema "palladium", e o filme não poderia ser assistido.
Então, os componentes típicos seriam: o HD do computador (ou DVD de alta capacidade),
a CPU do computador, o Sistema Operacional, o programa reprodutor de vídeo, o monitor do computador e as caixas de som. Isso é, se qualquer um desses componentes não for autorizado pelo detentor dos direitos autorais do filme, ele não poderia ser assistido. E se você pegasse o sinal de vídeo que sai do computador, duplicasse o mesmo, mandando uma cópia para o monitor autorizado, e outra para um sistema de gravação? - Nos monitores autorizados, mesmo os dados que passam entre o computador e o monitor vão criptografados. O programa reprodutor de vídeo só roda se tiver uma assinatura digital autorizada do fabricante - se o programa for alterado (para por exemplo, gravar uma versão descriptografada do vídeo no HD em vez de manda-lo para o monitor), ele não roda. E para garantir que essa proteção seria inviolável por software, até a CPU teria códigos de assinatura dos fabricantes. S e a assinatura não estiver lá, o sistema operacional não roda - ou se rodar,nãopermitirá queo os aruqivos de mídia espcial rodem.
Atualmente, o nome palladium não está mais sendo usado. Por um tempo, a Microsoft simplesmente chamou o esquema todo de "Next Generation Windows Security Blábláblá". Hoje ela não fala mais nele. Ou melhor, fala do jeito que o departamento de marketing fala. Eles nunca vão dizer que para ver um vídeo de alta-definição você terá que comprar um computador especial, com um monitor especial e com caixas de som especiais - e que o que todos esses componentes tem de especial é que você não terá nenhuma chance de usar o conteúdo de qualquer outra forma que não seja a determinada pelo fabricante. O que eles falam é que esse sistema não permite que vírus e programas não autorizados rodem no seu computador (o que não é verdade - isso só impede os vírus e programas não autorizados de mexerem nas partes "seguras" que são a reprodução peças de mídia protegidas)
Uma a uma, essas tecnologias estão sendo silenciosamente colocadas no mercado. A última geração de CPU's Pentium já implementa a parte relativa a CPU para esse esquema funcionar.
A Intel começou uma campanha de marketing de sua tecnologia para home vídeo "VIIV", por exemplo. O Marketing para esses produtos que vão tirar todo o controle das mãos do consumidor será avassalador. "Todo" o controle? Não! Como já citei, eles estão gastando bastante dinheiro nisso - e pagando pessoas habilidosas em todos os campos. E entre elas, existem pessoas cm um desconfiometro - elas sabem que se suprimirem todos os direitos que as pessoas tem sorbe as obras, isso seria patente demais e as afetaria negativamente. O Marketing vai ser avassalador. Então eles vão ser "bonzinhos" e permitir que você faça aparentemente bastante coisa. Eles podem permitir que você grave alguns minutos de seu "Ultra-HighDefinition DVD"ou qualquer nome que tenha o DVD da próxima geração.
Eles vão permitir que você assista o seu DVD sem que tenha um monitor "apropriado" - só que o vídeo vai passar com qualidade inferior. O Marketing vai fazer parecer que um problema tecnológico do seu monitor atual. Na verdade, a definição do vídeo seria exatamente a mesma no monitor "apropriado" e no monitor normal - mas mandando um sinal de vídeo para um monitor normal, haver a a chance de você gravar esse sinal de vídeo em outro aparelho.
Isso é controle absoluto sobre a mídia - esse "parecer bonzinho". Na prática, poderão vender livros e filmes que poderão ser lidos ou assistidos um número limitado de vezes - esse sistema permite isso.
Eu até acredito que sempre vai ser possível para algúem criar conteúdo com qualidade máxima para esses equipamentos de forma independente. Ou seja: você poderá produzir um vídeo para distribuir livremente pela Internet que não tenha as restrições impostas. O que os caras vão querer tirar do mercado, e com isso, o preço vai subir, é o computador como nós conhecemos hoje. Uma ferramenta que permite rodar qualquer programa e tratar qualquer tipo de dado digital. Onde você pode escrever seus próprios programas....isso vai sumir. Os computadores vão migrar aos poucos para maquininhas de consumo digital, onde nós não conseguimos colocar programas nosso para rodar (ou onde isso fica cada vez mais difícil). E isso já está acontecendo - veja celulares, PDA's, tocadores de MP# e mesmo aparelhos de DVD. O que vai acontecer? O computador que deixa rodar programas "genéricos" (segundo os vendedores), como um sistema operacional não assinado pelo fabricante vai ter cada vez menos demanda (Devido ao marketing dos outros produtos), e ai, seu preço vai subir. Então, se hoje, com R$1000,00 você compra uma máquina, onde põe Linux, Cinelerra, Audacity, GIMP, Blender, e começa a produzir, uma máquina que possa fazer o equivalente em alguns anos poderá custar 3 ou 4 vezes esse preço, talvez mais.
Esse é o futuro de onde nos aproximamos cada vez mais rápido -e é disso que o autor do artigo original estava falando.
João S. O. Bueno
03/09/2005
Marcadores: 2005, direito de autor, distopia, DRM, tecnologia